Deveríamos estar observando estes movimentos de juros que se avizinham esta semana no Brasil e nos EUA?
A justificativa aqui, além da questão fiscal, teria sustentação nos indicadores, especialmente de inflação e atividade econômica?
Nos EUA, a inflação se contraiu o suficiente e está a caminho da meta, para justificar o início do afrouxamento monetário, na intensidade em que o mercado financeiro propõe?
Ao Federal Reserve, ainda se imputa a culpa por atrasar o processo de aperto monetário e a retirada dos estímulos através do programa de Alívio Quantitativo (Quantitative Easing).
Desde a taxa de juros zero nos EUA, começou a se acelerar de maneira muito consistente a forte inflação de oferta, em partes consequência da forma como governos lidaram mundo afora com a crise pandêmica.
Com quase um ano de inflação ascendente e a crise pandêmica indo em direção ao seu fim, tornou-se inevitável o questionamento ao Federal Reserve sobre por quanto tempo a economia iria suportar tais escaladas de preços.
O Fed estava em nítida negação e resistia em retirar os estímulos e retomar a alta de juros, mesmo com a explosão inflacionária e retomada de indicadores de atividade econômica.
Finalmente cedendo, em novembro de 2021, o “Tapering”, a redução das compras de ativos começou e com seu fim, a autoridade monetária americana decide pelo aperto monetário em março de 2022, com 11 elevações de juros consecutivas até a atual taxa de 5,5% ao ano.
Somente três meses após o início do aperto monetário, o Fed então decide iniciar o Aperto Quantitativo (Quantitative Tightening), processo de redução do balanço do Fed (Balance Sheet).
Isso ocorria permitindo que uma quantidade definida de títulos fosse a vencimento e não reinvestida, com uma modesta chamada inicial de US$ 47,5 bi por mês, sendo US$ 17,5 em títulos lastreados em hipotecas (Mortage Backed Securties), não o suficiente, dado o tamanho em que o balanço atingiu.
Mesmo com tudo isso, ocorreu topo inflacionário do CPI de 9,1% e núcleo de 6,6% aa no segundo semestre de 2022 e aos 3,2% aa, ainda está muito longe da faixa histórica de 2%, também a meta informal do Fed na condução da política monetária.
Adicionando a tal conta, o déficit fiscal americano atingindo os US$ 35 trilhões, elencamos algumas razões pelas quais o Fed não deveria cortar os juros nesta na próxima reunião do FOMC.
- Inflação ainda elevada: Apesar de estar em desaceleração, a inflação permanece acima da meta de 2% e um corte de juros pode reacender pressões inflacionárias, tornando mais difícil controlar os preços a longo prazo;
- Economia resiliente: A economia dos EUA continua mostrando sinais de crescimento moderado, com um mercado de trabalho robusto, apesar dos dados abaixo das expectativas e consumo sólido. Cortar os juros prematuramente pode sobreaquecer a economia, criando desequilíbrios;
- Risco de bolhas financeiras: Dada a forte demanda do mercado financeiro, iniciar um ciclo de afrouxamento monetário por um período prolongado pode incentivar comportamentos de risco nos mercados financeiros, como a criação de bolhas em ativos e aumentos excessivos nos preços de ações e imóveis;
- Necessidade de manter ferramentas para crises futuras: Ao manter as taxas de juros agora, o Fed preservaria espaço para cortes futuros, caso a economia realmente entre em desaceleração ou crise. Reduzir os juros muito cedo limitaria a capacidade de resposta a crises potenciais, levando ao contrário do que se preconizaria como “pouso suave”.
Já o caso brasileiro, segue peculiaridades locais, as quais têm permeado a economia desde que o novo governo assumiu.
Após uma condução impecável da política monetária por parte da gestão Ilan Goldfajn, a qual conseguiu ancorar as taxas de juros longas abaixo de um digito e manter a taxa nominal em patamares aceitáveis à economia brasileira, 6,5% aa, vem a gestão Campos Neto.
No início, se imaginava que haveria basicamente uma continuidade daquilo que foi observado na gestão anterior e em julho de 2019, como forma a estimular a economia que se encontrava ainda ganhando tração, a Selic mínima foi renovada para 6,00% ao ano.
A reforma da previdência havia sido aprovada em primeiro turno e a inflação estava baixa e com isso, o mercado financeiro aguardava movimentos mais suaves da autoridade monetária a partir de então, projetando mais dois cortes possíveis de 25 bp.
Todavia, o ritmo de 50 bp foi mantido até a taxa atingir 4,5%, sob o pretexto de que a guerra comercial entre China e EUA deflagrada por Trump poderia ter efeitos econômicos globais negativos, daí a necessidade de estímulos.
O corte de fevereiro de 2020 foi realmente mais modesto, 25 bp, todavia, foi sucedido de uma série muito intensa de reduções de juros, atingindo 75 bp por reunião, com a pandemia como pano de fundo, levando a taxa nominal aos históricos 2% aa.
O Banco Central do Brasil, naquele momento, foi celebrado globalmente pelo pioneirismo no corte de juros para conter os efeitos da crise pandêmica e localmente, ainda que se tenha dilacerado o mercado de renda fixa, especialmente privado, foi exaltado por 7 entre 10 economistas.
Todavia, mantínhamos a posição crítica ao processo e um alerta de que, além de não criar o estímulo econômico esperado, dadas as características do mercado de crédito no Brasil, do spread bancário e da concentração do setor, tal corte de juros seria sucedido por um intenso aperto monetário.
Pois após 5 reuniões e 6 meses de juros a 2% aa, o esperado overshooting de juros veio, com uma primeira elevação da taxa acima das expectativas, com 75 bp e somente terminou com a taxa aos 13,75% aa, exatamente como preconizado, no meio da campanha eleitoral para presidente em 2022.
O início do governo Lula foi marcado por inconsistências na agenda econômica, a demanda por uma PEC de transição que daria um passe livre de gastos ao governo por praticamente 4 anos, sob a escusa de “reconstruir o país” e nenhum sinal de controle fiscal.
Tal imbróglio político durou por todo o primeiro trimestre de 2023 a parte do segundo trimestre, o que manteve o Banco Central em uma postura conservadora de juros.
A aprovação do arcabouço fiscal abriu caminho a partir do segundo semestre para um ciclo de afrouxamento que perdurou até março deste ano, quando o governo confirmou as premissas mais pessimistas e descartou cumprir as metas por ele mesmo estabelecidas em 2023.
Neste momento, com juros aos 10,5% aa, o Banco Central, considerando as desancoragens das expectativas de inflação e a pressão nas curvas de juros, retomou a postura conservadora, com anuência inclusive do grupamento escolhido pelo governo a compor a diretoria do Banco Central e consequentemente, o COPOM.
Ainda assim, desde então a inflação tem dado sinais benignos, com importante descompressão dos núcleos e parte dos indicadores econômicos só se mostraram mais fortes, devido à série ainda elevada gastos fiscais.
Como fizemos com o FOMC, seguem aqui algumas premissas do porquê o Banco Central não elevar os juros nesta quarta-feira:
- Inflação controlada: A inflação está dentro ou próxima da meta estabelecida pelo Banco Central. Elevar os juros em um cenário de inflação controlada pode ser desnecessário e prejudicial ao crescimento econômico;
- Redução dos preços das commodities: O enfraquecimento dos preços globais de commodities, como petróleo e alimentos, alivia as pressões inflacionárias no Brasil.
- Dívida pública elevada: Ainda a demanda por aperto monetário seja, em grande parte, da questão fiscal, por outro lado, juros altos mantém o custo de carregamento da dívida elevado, pressionando ainda mais as contas públicas. Como o atual governo não sinaliza a redução de gastos, a elevação de juros impacta cada mais no processo;
- Fragilidade da recuperação econômica: A economia brasileira está se recuperando de forma moderada, com setores ainda frágeis, como o consumo e o investimento. Aumentar os juros poderia frear essa recuperação, desacelerando o crescimento do PIB;
- Cenário global incerto: O cenário internacional, especialmente com a desaceleração econômica de grandes economias como a China e a Europa, pode impactar o Brasil. Um aumento de juros neste momento poderia deixar o país menos competitivo e mais vulnerável a choques externos;
Portanto, em vista aos fatos acima apresentados, questionamos se seria prudente estes Bancos Centrais alterarem os juros neste momento.
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