Antes, duas observações pra entender o título:
Não estou comparando o educador a um medicamento.
Na verdade, meu ponto é o senso crítico defendido por Freire e negado por muitos de seus atuais defensores, uma incoerência ultrajante que envergonharia o próprio pensador.
Portanto, vamos à comparação que fiz.
Quando mencionei a KloroKina, falo do barulho que se faz nas críticas ao que quer que seja sem o debate necessário. O tal medicamento talvez seja o “personagem” mais conhecido desse fenômeno recente de comunicação trágica.
Quando médicos, fazendo o que se espera deles, prescreviam o medicamento lá no começo de tudo isso o que estamos ainda vivendo, com conhecimento da droga de, até então, uso corrente e sem efeitos colaterais importantes, o assunto foi politizado de um tanto que o remédio virou, repentinamente, veneno imprescritível.
Muitos dos críticos, à época, podem ter sido os hoje defensores do modelo educacional de Paulo Freire. Falo dos politicamente ideologizados, não educadores sérios.
Mas o mais importante nisso é que a crítica ao medicamento foi insana, feita por gente que não conhecia o medicamento, não era especialista e se criou uma patrulha ideológica que impediu o debate franco e sério.
Inverto as coisas, agora.
Quando educadores, fazendo o que se espera deles, defendem ou simplesmente querem colocar em pauta a discussão sobre os métodos educacionais de Paulo Freire, porque o estudaram e, como é esperado, querem comemorar o aniversário do pensador brasileiro em seu centenário de nascimento, o assunto foi politizado de um tanto que o educador virou a explicação de todos os problemas educacionais do Brasil.
Muitos de seus críticos podem ser os que ontem apenas estavam interessados em encontrar meios de enfrentar o terrível problema sanitário que nos afeta e que hoje, por ideologia, também não aceitam o debate.
O que importa é que a educação brasileira tem de ser discutida, todos dependemos dela e a patrulha terminativa de hoje não nos permite fazer, como aconteceu com o medicamento em meio a uma crise sanitária de proporções épicas.
Duas certezas:
Quem está doente precisa de remédio e de médicos livres para exercerem a medicina e salvar vidas, sem perseguição ideológica.
Quem está na escola ou tem filhos na escola precisa que a educação seja eficiente, moderna, que prepare os alunos para a vida e que professores consigam fazer isso com a melhor pedagogia possível.
Nenhuma das certezas acima será verdade sem que se permita o debate real, que médicos e educadores não sejam patrulhados ideologicamente, possam exercer suas profissões sem a pressão da opinião de gente desprovida de conhecimento técnico ou de uma mídia que não os respeita tecnicamente porque se tornou partidarizada, o que é uma afronta ao público.
O que todos queremos e precisamos é de eficiência na saúde, na educação, em tudo.
Mas nada disso vai acontecer se não houver liberdade para o debate e respeito aos debatedores. Patrulha e perseguição, não!
Além do partidarismo em tudo, vimos muita gente defendendo a censura para o opositor. Jornais de um lado político silenciaram-se na defesa da liberdade de imprensa de outros jornais. Profissionais de imprensa fizeram o mesmo. Brasileiros se omitiram – e até elogiaram – prisões por opinião sem o devido processo legal.
Dito isso e voltando à comparação que fiz, é claro que a KloroKina ou outra droga pode ter benefícios importantes de um lado ou não ser a cura perfeita que se espera. Talvez não ser nem o remédio que deva ser usado. Mas não se vai chegar à resposta perseguindo ou ridicularizando médicos que fazem o que se espera deles: avaliar riscos e benefícios diante da situação com tudo o que estudaram para conseguir atingir o objetivo de reduzir as dores de doentes e salvar vidas.
Dito isso, é claro que Paulo Freire e seus métodos podem ter aspectos positivos na educação ou não serem nada do que se espera para uma educação realmente moderna e eficiente. Mas não se vai chegar à resposta perseguindo ou ridicularizando educadores que fazem o que se espera deles: avaliar métodos que atendam as necessidades educacionais deste país, com tudo o que estudaram para educar jovens a se prepararem para um mundo cada vez mais desafiador.
Sem debate de verdade e sem respeito às diferenças não avançamos.
Politizando tudo, regredimos.
Não é o que está acontecendo agora? O quanto você se permitiu ao bom debate e o quanto o prejudicou com suas opiniões apressadas? Ou deu crédito e audiência para os fanáticos?
Por fim, como anunciei lá no começo, vou me deter a um aspecto muito importante da teoria de Paulo Freire, a criação do senso crítico entre os estudantes. A capacidade de questionar a informação que recebe, de não aceitar automaticamente tudo o que recebe de informação sem ponderar, sem se valer da crítica. Questionar é tão importante quanto se responsàvel nas críticas, o que requer compreender o tema. Senão é crítica pela critica e uma perda de tempo que não produz avanço. Mas vou me ater somente ao aspecto imprescindível do senso crítico.
Quando eu estava na escola fundamental e média, no final dos anos 70 e em todos os 80, não se falava de Paulo Freire. Mas pela educação que recebi em casa e na escola, e devo isso aos meus pais e professores, desenvolvi um senso crítico apurado. Era necessário e estava na moda, dada redemocratização do país. A vida profissional como jornalista e documentarista só aprimorou esta minha visão crítica e questionadora das coisas.
Mas ter senso crítico hoje, o que deveria ser libertador e um avanço no debate e na busca por soluções sustentáveis, tornou-se um perigo.
Use tal senso crítico para questionar as certezas dos atuais movimentos lacradores – que não pensam nem respeitam ninguém, apenas lacram – sejam sociais ou políticos, e me diga lá se você não será perseguido, denegrido e cancelado?
Questione as tentativas de revisionismo histórico ou movimentos sociais afirmativos, não porque é contra, mas apenas porque vê incoerências ou quer compreendê-los melhor, considerar pesos e medidas, e me diga lá se não será perseguido, xingado e cancelado?
Será até pelos defensores de Paulo Freire. Não os estudiosos sérios de seu método, mas por todos os partidarizados fanáticos que mal conhecem o educador e estão apenas fazendo sua defesa barulhenta para aumentar a temperatura política.
A quem realmente interessa a exclusão do debate de verdade e dos debatedores sérios?
Por Adalberto Piotto.
Em tempo: *a grafia esquisitona de “KloroKina” é para driblar os algoritmos da rede social. Como algoritmos calculam e não pensam nem compreendem contextos porque não leem antes de te censurar, estúpidos que são (parece até gente, né?), foi preciso fazer a manobra.
Quem está doente precisa de remédio e de médicos livres para exercerem a medicina e salvar vidas, sem perseguição ideológica. Quem está na escola ou tem filhos na escola precisa que a educação seja eficiente, moderna, que prepare os alunos para a vida e que professores consigam fazer isso com a melhor pedagogia possível. Nenhuma das certezas acima será verdade sem que se permita o debate real, que médicos e educadores não sejam patrulhados ideologicamente, possam exercer suas profissões sem a pressão da opinião de gente desprovida de conhecimento técnico ou de uma mídia que não os respeita tecnicamente porque se tornou partidarizada, o que é uma afronta ao público. O que todos queremos e precisamos é de eficiência na saúde, na educação, em tudo. Clique no link e leia o artigo completo. Mas nada disso vai acontecer se não houver liberdade para o debate e respeito aos debatedores. Patrulha e perseguição, não!